"Há prazeres que quando satisfeitos levam à dores maiores". Advertência epicurista.
Alguns críticos da RD afirmam que essa abordagem poderia passar ao usuário uma falsa impressão de que o uso de drogas pode ser seguro, ou afirmam que tal estratégia tornaria o uso de drogas mais aceitável pela sociedade, e que a única abordagem correta para o problema é a abstinência total. Antes de mais nada, é pouco prático, em um primeiro momento, exigir de um usuário inveterado abstinência total, isso só geraria mais resistência ao tratamento. Segundo, a RD tem por objetivo final a abstinência. Terceiro, a redução de danos tem um efeito de reduzir o consumo de drogas com o tempo. Um exemplo disso é um estudo feito na Suíça, com usuários de heroína (The Lancet). Quarto, ela não se aplica à crianças e adolescentes, que possuem capacidade de julgamento limitada em comparação aos adultos, nem se aplica à gestantes e situações em que os riscos causados pela droga são muito altos. E, por fim, o tratamento de redução de danos prevê que o usuário deve ter acesso garantido à outras abordagens, como a oferta de tratamentos que reduzam o desejo de consumir a droga ou reduzam os efeitos da abstinência. Em último caso está previsto a internação involuntária.
Citando trechos da Política Nacional Sobre Drogas do Brasil (pág 65), para que não haja dúvidas: "Buscar, incessantemente, atingir o ideal de construção de uma sociedade protegida do uso
de drogas ilícitas e do uso indevido de drogas lícitas";"Não confundir as estratégias de redução de danos como incentivo ao uso indevido de drogas, pois se trata de uma estratégia de prevenção."
Observação: recomenda-se que os programas de redução de danos estejam ligados à instituições de saúde e sejam informados previamente às autoridades locais, para evitar problemas com a lei.
Eis algumas das recomendações feitas por programas de redução de danos:
- informar-se sobre a substância consumida, seus efeitos colaterais e os sinais de intoxicação aguda/overdose.
- Manter-se bem alimentado e hidratado, e fazer uma refeição antes de consumir substâncias
- consumir água durante o uso de substâncias, principalmente de substâncias com efeito diurético, como álcool e ecstasy.
- Não consumir drogas no horário de dormir, nem antes ou durante o trabalho, nem enquanto dirige.
- Não compartilhar materiais usados no consumo de drogas. No caso de drogas injetáveis, usar só material descartável (alguns programas de RD inclusive fornecem gratuitamente esses materiais), limpar bem o local da injeção, para evitar infecções, e injetar lentamente para evitar overdose.
- Dar preferência às formas orais ou em adesivos. Evitar o consumo de inaláveis (fumados) e injetáveis.
- Em caso de fumos e inaláveis, usar dispositivos com filtro (como cachimbos)
- A fissura é um desejo súbito e muito intenso de consumir a droga novamente. Sabendo que a fissura possui apenas minutos de duração, fazer o possível para resistir ao desejo até que ele cesse.
- Carregar sempre consigo documentos para identificação e um cartão informativo com endereço, nome de familiares e telefones para contato em caso de emergência.
- Evitar usar drogas durante períodos de sofrimento emocional. Nessas ocasiões duas coisas podem ocorrer: a droga cessa os sentimentos ruins e gera bem-estar, reforçando a dependência; ou o usuário passa a ter sintomas desagradáveis e intensos (bad trip), podendo desencadear um surto psicótico, agressividade e mesmo tentativas de suicídio.
Além dessas recomendações, há outras recomendações que podem ser feitas aos usuários (algumas dessas são baseadas em opinião própria):
- Evite consumir drogas sozinho. Estar em grupo encoraja atividades coletivas que podem distrair a pessoa do desejo de consumir a substância. E se os companheiros forem conscientes, regularão o uso abusivo e intervirão em caso de algum problema provocado pelo uso.
- Se o consumo não está gerando sensação prazerosa, ou exige doses muito altas para obter o mesmo efeito, é sinal que o consumo está muito frequente ou as doses estão muito elevadas. Tendo consciência disso, aumente o intervalo de consumo e reduza a dose consumida.
- Interrompa o uso se não estiver obtendo mais sensações prazerosas. Isso é sinal de que a droga não tem mais nada a lhe oferecer.
- Sintomas de abstinência são outro sinal de alerta para dependência. Se isso ocorrer, faça de tudo para controlar esses sintomas, menos consumir a droga novamente. Procure ajuda médica, se preciso.
- Empobrecimento de repertório (isto é, começar a consumir materiais de qualidade inferior ou em circunstâncias inadequadas) é outro sinal de alerta. Mantenha o padrão de consumo o mais elevado possível, se não com o material, pelo menos com as circunstâncias de consumo, e adira às práticas de redução de danos.
- Jamais tente consumir outra droga diante de sintomas de abstinência ou na ausência da droga usualmente consumida. É comum traficantes dizer que as drogas possuem o mesmo efeito, ou que uma droga suprirá a ausência de outra. Isso é só uma estratégia para introduzir o usuário à drogas de maior poder viciante, e pode provocar a dependência à mais de uma substância.
- Evite todas as circunstâncias, objetos e, se preciso for, pessoas que façam você lembrar ou possam incentivá-lo a usar a droga.
- Evite o cheiro, o toque, a primeira tragada, o primeiro gole. Eles provocam fissura.
- Tome banho e lave as roupas depois do uso, para se desfazer do cheiro da droga em suas roupas. Se o cheiro ficou impregnado na roupa e não pode ser removido, jogue-a fora.
E, recordando mais uma vez Epicuro: "o que é bom é fácil de se obter; o que é mal é fácil de se suportar". Precisamos de muito pouco para viver e ser feliz. As drogas são opções muito insensatas e limitadas diante de tantas opções que temos para desfrutar a vida.
Até breve.
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