quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Erros comuns sobre o Epicurismo

Epicurismo segundo o dicionário:

1. doutrina do filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.) e seus epígonos, caracterizada por uma concepção atomista e materialista da natureza, pela busca da indiferença diante da morte e uma ética que identifica o bem aos prazeres comedidos e espirituais, que, por passarem pelo crivo da reflexão, seriam impermeáveis ao sofrimento incluído nas paixões humanas.
2. o modo de viver, de agir, de quem só busca o prazer; sensualidade, luxúria.
3. desregramento de costumes, falta de temperança; devassidão, libertinagem.

Dois exemplos de como o Epicurismo tem sido interpretado pela cultura popular:

http://www.spectrumgothic.com.br/literatura/epicureia.htm

Edward Sellon. O novo Epicuro- As delícias do sexo.

A primeira definição é a mais condizente com a realidade. Mas as outras definições, criadas pelos opositores do epicurismo em 2300 anos de história, tem sido muito divulgadas, gerando no público uma impressão errada dessa doutrina. Para ter uma melhor compreensão do Epicurismo, devemos esclarecer os principais mitos e enganos associados à ele:

- O Epicurismo prega apenas o prazer como modo de vida
O prazer é importante para Epicuro sim, desde que seja apreciado com prudência. O prazer irresponsável pode trazer consigo sofrimentos, e a busca por prazeres inúteis ou difíceis de alcançar causaria ansiedade, o que na verdade até dificulta a busca pela felicidade. O prazer deve ser apreciado sim, desde que de forma responsável.

- Os prazeres a que Epicuro se refere são os prazeres sexuais, a comida, a bebida, o luxo e as orgias
Antes de mais nada, o estilo de vida epicurista é simples. O epicurista é encorajado à lutar pelas coisas que necessita. O luxo até é bem-vindo, mas o apego e a cobiça pelo luxo não, pois fazem a pessoa sofrer sem necessidade. E os prazeres que Epicuro se referem não são apenas esses prazeres sensuais que os oponentes referiam. Entre os prazeres mencionados por Epicuro, tem o prazer da amizade, de ajudar os amigos, o prazer da filosofia, a ausência de dor; e o prazer mais importante seria a ataraxia, ou tranquilidade, pois pode ser desfrutado independente dos problemas em que a pessoa se encontra. Mostrando que o Epicurismo está aberto aos prazeres da alma. Ademais, Epicuro incentivava a prudência, e desaconselhava abusos na busca do prazer, para evitar possíveis sofrimentos. Devemos desfrutar do prazer sem sermos dominados por ele.

- O Epicurismo é a favor da embriaguez e do uso de drogas
Os seguintes sofrimentos podem ser decorrentes do uso das drogas: vício (um desejo forte e inútil, causa de perturbação), atitudes irrefletidas motivadas pelos efeitos da droga, dano à saúde física e mental, diminuição da capacidade cognitiva e do poder de reflexão, problemas com a lei e a sociedade. Diante das drogas, o epicurista deve se perguntar: conheço bem aquilo que estou consumindo? Quais os efeitos desejados e quais os riscos que essa droga apresenta? Sou capaz de desfrutar esses prazeres e ao mesmo tempo evitar esses sofrimentos? É possível alcançar prazeres similares à esses mas sem os mesmos riscos e sem os mesmos custos? Se eu estiver perto de perder o controle, terei o discernimento, a força de vontade e o apoio para sair, antes que o vício tome conta de mim? Para o epicurista, trata-se apenas de um cálculo prudente e com muitas variáveis práticas. Nem todas as drogas são iguais. Mas, como de modo geral todas podem ser prejudiciais, a postura mais prudente (e mais fácil) é a abstinência.

- O Epicurismo apregoa o ateísmo.
Os escritos originais de Epicuro não permitem tirar essa conclusão. Se Epicuro foi ateu, este fato ele ocultou de seus seguidores. Na verdade Epicuro não acreditava nos deuses que eram adorados pelo povo da época, e via o temor à esses deuses como um medo irracional, uma superstição. Epicuro descrevia os deuses como seres compostos por átomos, porém numa condição superior à do ser humano, com uma vida mais longa, desfrutando de maiores prazeres e livres de muitas das dores que afligem o ser humano. Estando em tal estado de bem-aventurança, não haveria porque os deuses fazerem mal ao homem ou se preocuparem com os assuntos mundanos. Ademais, como eles não se fazem visíveis, é provável que eles nem possam ser alcançados ou conhecidos. Porém, muitos epicuristas foram ateus e atacavam abertamente as religiões instituídas. Eu, pessoalmente, acho que a pessoa que se interessa pelo Epicurismo pode cultivar uma espiritualidade, desde que essa lhe traga bem-estar e crescimento pessoal. Não se admitiria práticas espirituais que tragam consigo o medo dos deuses, o medo da morte, o medo do invisível, a superstição e que tragam restrições à liberdade individual e ao pensamento crítico.

- O Epicurismo é contra o casamento e a família, e pregava o sexo livre
Epicuro não era a favor do sexo livre, pelo contrário. Sobre o sexo, ele teria dito: "O sexo não traz benefícios; mas é desejável, desde que não provoque dano". Os danos e as ansiedades que o sexo pode trazer (principalmente em épocas e lugares que não possuem métodos de proteção e anticoncepção disponíveis) são muito grandes. O sexo é um desejo natural e necessário para a preservação da espécie, e por si só é uma coisa boa. Porém, não é essencial para a vida do indivíduo nem considerado fundamental para alcançar o estado de felicidade. Agora, quanto à família, essa é uma necessidade natural, principalmente na infância, quando as crianças precisam ser cuidadas e educadas, do contrário não poderão sobreviver, se desenvolver e se integrar à sociedade. E se a família cumprir essas funções, a forma que ela assume não é relevante. Além disso, os laços de amor e amizade que se formam dentro de uma família são muito bons para promover a felicidade.

- O Epicurismo é subversivo, contra as leis e contra os costumes.
Os epicuristas encorajavam o pensamento crítico e a reflexão sobre as crenças e costumes da sociedade. Porém, eles não opunham aos costumes que achavam úteis para promover a paz e o bem-estar social. Um exemplo disso são as leis contra o roubo e o assassinato, que com certeza são úteis e devem ser obedecidas. Recomenda-se obedecer aos costumes bem estabelecidos por uma questão de conveniência, para poder conviver tranquilamente com os integrantes da sociedade e evitar escândalos. O que o epicurista questiona de fato é a legitimidade desses costumes: uma lei ou um costume não deve ser considerado legítimo só porque faz parte da tradição ou porque tem a sanção de uma autoridade, mas sim por que a obediência traz consigo resultados práticos.

O Epicurismo busca desfrutar um prazer comedido, e incentiva a reflexão antes da ação. Busca a felicidade do ser humano, e busca educá-lo, de forma que este saiba como ser feliz e evite causar sofrimento a si mesmo e aos outros. Não se baseia na autoridade de um filósofo, nem exige que se acredite em tudo que se é ensinado, antes encoraja o pensamento crítico. A pessoa que seguir esses princípios não fará isso por obrigação ou fascinação, mas porque concluiu por si mesma de que eles são coerentes com a realidade e úteis para alcançar a felicidade. E eu, pessoalmente, acredito no potencial transformador dessa filosofia na vida das pessoas, e é por isso que tento aplicá-los no meu dia-a-dia. E agora, pretendo fazer com que essa filosofia seja mais conhecida, começando por esse blog que escrevo. Espero que o que está escrito aqui ajude as pessoas a serem mais felizes, motive elas a promover a felicidade do ser humano ou que de alguma forma traga coisas boas em suas vidas.

Até breve.

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